A cidade do Porto e o Coro do DeCA

O Osvaldo era um tipo porreiro.
Soa um pouco estranho, mas é esta a frase que me vai martelando no cérebro mesmo antes de começar este texto. Mas talvez seja melhor começar mesmo do início...
E no início está o Porto. A cidade que, em tempos, foi minha por uma dezena de anos. E hoje foi dia de voltar lá. Houve tempo para chegar um bocadinho antes e voltar a fixar o olhar no 290 da Miguel Bombarda. Um pouco acima, mesmo ali ao lado, percorro Cedofeita quase de uma ponta a outra como fiz outrora alguns milhares de vezes. O café onde parava de manhã e à noite é agora uma boutique. Paro em frente à vitrine e vejo no reflexo a saudade trazida por um rosto igual ao meu. Enquanto sigo o caminho lembro o sorriso rasgado do Osvaldo que todos os dias me trazia o café ao balcão e trocava dois dedos de conversa comigo sobre o nosso Benfica. Nunca mais o vi. Os anos passam. As pessoas também.
Enquanto a praça dos leões vai ficando cada vez mais para trás vou dizendo para os meus botões que ao contrário do que dizia o grande Ary dos Santos, esta é que será a cidade mulher da minha vida.
O relógio parece correr pelo que o passo tem de ser cada vez mais apressado. Mesmo antes de chegar à igreja há ainda tempo para recordar o campo de futebol do CDUP onde passei mesmo há pouco e que me fez reviver os tempos em que fui campeão universitário de futebol de cinco. Quem diria que agora tenho um tornozelo que parece papel?!
Chego à igreja. Mais do que as vozes, afinam-se os últimos pormenores. O Nuno prepara tudo com a qualidade e responsabilidade que lhe são reconhecidas. Os homens trazem roupa de gala e as meninas, neste dia, parecem ainda mais bonitas que nos restantes dias. De tal forma que não cansa o olhar. No concerto há tempo para reconhecer gente amiga na plateia. No final, cumprimenta-se o Filipe e pede-se desculpa ao professor Vasco por só ter marcado presença à noite e ter estado ausente no ensaio da tarde. 
A caminho do carro, sozinho, do tal lado da rua em que parece ser sempre mais noite, vai-se pensando que fazer música em conjunto deve ser das sensações mais extraordinárias que se pode ter. De tal forma que é praticamente indescritível. A sensação é quase como se o Benfica estivesse todo nos meus pés, Chopin todo nas minhas mãos e a 4.ª de Brahms já estivesse comigo desde o dia em que nasci. Sei lá...
Liga-se o carro e a M80 que me dá o “Straight from the Heart” do Bryan Adams logo de início. São 60 Km que se avizinham e é aí que vou escrevendo na cabeça o texto que agora deixo aqui. Sem pressas. Talvez por isso a meia-noite tenha voltado a chegar a casa primeiro do que eu. Não faz mal.
É altura de caminhar de mansinho para os filhotes não acordarem. Pouso a cabeça no travesseiro. O Osvaldo era um tipo porreiro, já disse?
Boa noite.

2 comentários:

Lola disse...

O texto é uma delicia? O café nao se chamava Encontro?

Miguel Brandão disse...

Prof. Rosa, nem me lembro do nome do café. Era um daqueles tascos que descobri mais tarde que o dono era de Arouca.
Havia o "Encontro", o "Célia" (morava mesmo ao lado) e o popular "Piolho". Eram os mais frequentados pela classe estudantil, sobretudo pelos que gostavam de noitadas.
Não era o meu caso. Eu era só mesmo de manhã, às vezes na hora de almoço e depois no final da tarde, no regresso da cantina enquanto ia para casa.
Muitas dessas vezes fui com um amigo também de Arouca que me acompanhou nos primeiros anos de Universidade.
Ontem recordei um bocadinho desses tempos. As partes boas. Aquelas que são boas de guardar =)
Beijinho.