Algumas boas memórias com o Sérgio

Quando somos pequeninos é muito fácil fazermos amizades. Na minha infância, no recinto da antiga escola primária, fui amigo de dezenas e dezenas de outros meninos que, como eu, aí se deslocavam para brincar. Dentre esses estavam os que se entranhariam mais na minha vida, quanto mais não fosse porque estavam lá comigo a toda a hora. Lembro-me de nuns dias brincar com uns, noutros dias com outros, mas praticamente todos os dias estava lá o Sérgio. E isso deixa marcas. Das boas, felizmente.
Engraçado que quando começo este texto sou atraiçoado pela minha memória. Logo ela que costuma ser tão clara para mim quando aos assuntos da meninice diz respeito. Mas hoje começa logo por falhar. E digo isto pois quando comecei a organizar as primeiras ideias para este texto a primeira coisa que me tentei lembrar foi da tua bicicleta de infância. Desculpa, mas não consegui. Lembro-me bem de eu andar numa pequenina vermelha e toda velha que já tinha sido da minha irmã Isabelita e também recordo de andar numa maiorzinha, também avermelhada, que era do meu irmão. Só quando fiz uns 14 anos o meu pai me deu uma bicicleta “de montanha” que ainda existe e que hei-de recuperar. Quando o meu pai ma ofereceu nos anos foste o primeiro amigo que encontrei quando cheguei com ela novinha a Rossas e, por isso, foste o primeiro a experimentá-la.
Mas, voltando um bocadinho atrás... Consegui lembrar-me de uma bicicleta de crosse azul clarinha com os punhos amarelados que era do teu irmão, de uma vermelha que o Tono tinha e até de uma preta com os punhos vermelhos que era do Paulo mas de ti... nada. Talvez te tivesse acontecido como eu e tenhas, na altura, ficado com a que era do teu irmão. Como eu que tanto tempo usava a que tinha sido da minha irmã. Se calhar, por isso é que não me consegui lembrar. Desculpa.
Mas, felizmente, consigo lembrar-me de muitas outras coisas.
Lembro-me que andávamos juntos nos ensaios do grupo coral dos mais novos e também de, a certa altura, teres feito parte do teu percurso da escola primária em Mansores. Lembro-me também daquela camisola branca com umas riscas verdes e com um jogador na frente que as nossas mães fizeram iguaizinhas e que ainda duraram bastante tempo. E de quando íamos com a “seita” ver filmes para minha casa ou para casa da Sara. Tenho tantas saudades desses amigos... Esses com quem íamos muitos dos dias das nossas férias para a serra e por lá passávamos as tardes na água ou a jogar cartas.
Lembro-me ainda de ter ido contigo certo dia a S. J. da Madeira pois querias comprar alguma roupa e assim passamos a tarde os dois.
Foste ainda meu companheiro de equipa em muitos dos torneios do Sajú e em muitas das festas que fizemos ao serviço da Banda Musical de Arouca. Recordo em especial um regresso de uma festa fora em que à saída, na barroca, o meu clarinete ainda andou uns metros pelo chão. Ai que riso...
Chegámos também a jogar algumas vezes Commodore Amiga (deveriam ter sido mais) que o teu pai também quase comprou para ti.
Lembro-me ainda de ter partilhado o palco contigo no teatro na canção “O Garoto da Rua”, por exemplo. E lembro-me também de ter sido o teu parceiro de equipa na primeiro torneio de malhas organizado pelo GCR Rossas onde até ficamos bem classificados.
Para o futuro, para continuar a reavivar boas memórias, tenho ainda guardada uma carteira que tu e o teu irmão me ofereceram quando regressaram duma viagem que fizeram ao Brasil. O meu irmão haveria de ficar com uma mais azulada com um Porsche e eu fiquei com uma mais avermelhada que tinha estampado uns pássaros tropicais. Cada vez que lhe pego ainda cheira a infância.
Lembro também episódios menos bons como naquele dia em que ao fim da tarde contavas com todo o pormenor o incêndio na carrinha azul do teu pai. E foi assim que mais tarde essa carrinha azul deu lugar a uma vermelha que ainda hoje recordo como a “SX-55-60”. Se calhar os números até estão errados mas foi assim que recordei até aos dias de hoje. Há coisa que nos ficam na memória, sabe-se lá porquê...
Antes de terminar há ainda duas lembranças que gostaria de partilhar. Talvez por serem das minhas favoritas.
A primeira foi no dia em que o Padre Moreira Duarte veio a casa dos meus pais para apresentar o Padre Ramos que seria o novo padre da freguesia. Lembro-me que estávamos vários da “seita” reunidos em minha casa algures numa sala lá em cima e o meu pai lá me chamou a mim e ao meu irmão para conhecer e cumprimentar o novo padre. Lembro-me de estarmos cá em baixo a falar e ouvirmos alguns estrondos que só mais tarde perceberíamos o que seria. Creio que tu e outros que estavam lá em cima tinham saltado da varanda diretos para a estrada para não terem que ir cumprimentar o novo padre. O que nos rimos depois com isso. Ai como eu queria voltar a estar lá...
A memória que guardo com mais carinho, que não irei explicar aqui, mas que os daquele tempo certamente se lembrarão, resume-se a duas frases que agora aqui te deixo. Imagina-me a rir enquanto as escrevo. Se a tua memória ainda não te atraiçoa, certamente te serão familiares: “Michael Night a da home a da fight” e “A Jangalon a da Selva”.
E, por hoje, é mais ou menos isto que queria partilhar contigo. É uma forma de te dar os parabéns e de te dizer que guardo desde esses tempos o carinho que ainda hoje trago por ti. Mesmo que as nossas vidas há muito se tenham desencontrado. É natural. Acredito que faz parte do percurso natural da vida. Mas hei-de estar sempre grato à família do Isaías e da Fernandinha do Paço. A eles devo muito do que sou hoje.
Há um filme antigo do qual gosto muito em que o ator principal termina com a seguinte frase: “Nunca mais tive amigos como quando tinha 12 anos. Mas quem é que tem?”
Parabéns amigo.
Entretanto vou andando pelo facebook para ver como te vão correndo as coisas.
Grande abraço. Também por hoje, mas sobretudo em nome desses muito bons velhos tempos.

Miguel

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