Sons do Imaginário


Um dia vou ser compositor. Hoje é o dia.

Fazer o caminho com as costas voltadas para o futuro muitas vezes traz as suas vantagens. Torna-nos mais conscientes dos passos que damos ao presente. Engrandece a sensação de realização pessoal que não seria tão vincada se andássemos distraídos.
Quando era ainda muito pequenino, no início da década de 80, o meu pai ensinou-me os primeiros conhecimentos musicais. Por entre tantos livros que me foi apresentando e que nunca terei capacidade suficiente para agradecer da forma que seria justa, estava uma colecção de vários volumes que continha as partituras de muitos dos êxitos dos maiores compositores da História da Humanidade. A complementar tudo isso trazia nas páginas finais uma pequena biografia de muitos desses compositores. Lembro-me de ficar deliciado com todas aquelas histórias de vida e em como queria ter nascido mais capaz para que um dia a minha história pudesse ser um pouco descrita como a das linhas que acabava de ver.
Sim, eu sei... Quem nasce Miguel nunca há-de chegar a Mozart. Mas as pequenas conquistas tomam, frequentemente, a dimensão que lhes sabemos reconhecer. Por isso pai, hoje, queria dizer-te que estavas certo. Desde a primeira hora. Desculpa o meu grande devaneio pela Matemática. Obrigado por me teres apresentado Liszt, Beethoven e Chopin. Ou Schubert e Rossini. Tenho com eles mais cumplicidade do que com Fermat ou Gauss.
Sabes? Valeu a pena. Quando me decidi a enfrentar esta aventura de tentar voltar a estudar aos 37 anos, fi-lo com algum receio. Já não tenho o tempo nem o engenho de outros tempos. A capacidade é outra e em muito menor quantidade. Vim para a faculdade para alargar o meu conhecimento mas, sobretudo, os meus horizontes. Queria ser capaz de fazer bons arranjos e de compor algumas aberturas para Banda. Mas cheguei cá e outros caminhos se abriram.
E hoje, apenas hoje, vão chamar-me "compositor". Vou ter a oportunidade de ouvir pela primeira vez o meu "Bailado" para piano. Fica descansado que eu prometo conseguir uma gravação para te mostrar um dia destes. E dá um abraço meu à mãe que sem ela eu nunca teria continuado o caminho que tu me fizeste começar.
Sabes... Estou em boas mãos. Não fosse a Odete e eu talvez nunca me tivesse inscrito neste curso de Composição. Espero ser capaz de um dia conseguir apresentar a música à Rita e ao Tiago como tu o fizeste comigo. Porque, acredites ou não, já deu muitos frutos.
E agora desculpa mas vou-me preparar para um concerto.
Um abraço enorme.

2 comentários:

jcerca disse...

Bem, depois de um Introito destes, a "dança" vai mesmo ser muito boa, disso não tenho qualquer dúvida!
E um dia destes havemos de admirar os passos artísticos e escutar os acordes mágicos, nem que seja a partir do balcão de um qualquer "avião de papel".

Prado disse...

De música percebo pouco (só mesmo ouvi-la!). Mas tenho que agradecer aos teus pais (principalmente à tua mãe) o gosto pela leitura. Gosto esse que nunca perdi. Aliás, neste momento estão dois livros na mesinha de cabeceira parcialmente lidos! Ora, este intróito (com acento, pois o novo acordo só mesmo em documentos oficiais e porque sou obrigado) vem a que propósito?! Foi na escola primária que primeiro tive contacto com uma biblioteca e penso que li quase tudo o que lá estava e lembro-me de ter lido (e ficado fascinado) com as biografias de Mozart e Beethoven, entre outros. Bons posts!