O Chalana e o Simão

 

Olá Simão.
Imagina um tempo em que eu era mais pequenino. Ainda mais novo do que tu.
Em Rossas, o edifício da escola primária estava diferente do que vemos hoje. No recinto do recreio, os postes das balizas eram pedras colocadas no chão e a bola (quando existia) era quase sempre de borracha. As equipas eram feitas depois de um par ou ímpar entre dois colegas. Podes não acreditar mas, nesse campo, joguei vezes sem conta com o Chalana, não sei se já ouviste falar... Claro que não era mesmo o meu grande ídolo de infância, aquele que aos domingos à tarde o Ribeiro Cristóvão relatava na Rádio Renascença e que fazia as delícias dos adeptos do Benfica. Era o outro, o meu colega de escola primária e que viria ainda a ser da minha turma também no primeiro ano do ciclo preparatório. Era assim que chamávamos ao teu pai nessa altura. Porque embora pequeninos, queríamos ser grandes. E a sê-lo, escolhíamos os melhores. Por isso nos intervalos corríamos e brincávamos como se o Benfica (ou o Porto e o Sporting, conforme as preferências de cada um) estivesse todo nos nossos pés. O Ribeiro Cristóvão nunca esteve em Rossas mas poderia ter feito relatos de autênticas finais se tivesse visto o Quiquinho, o Pedro do Neca e o do Selmo, o Eduardinho ou eu e o teu pai. Havia habilidades para todos os gostos.
O tempo passa por nós num piscar de olhos. Hoje trabalho na Academia de Música e o teu pai já foi até Presidente da Junta de Freguesia. Vamo-nos encontrando aqui e ali, trocamos dois dedos de conversa, umas risadas e voltamos ao nosso dia-a-dia e às nossas obrigações.
Gostei de ver o teu pai na televisão. E enquanto cantavas eu ia lembrando todas as pequenas histórias da minha meninice em que o teu pai também era protagonista.
Tens o talento natural para estar num palco. Não só no fado mas também na representação. A tua performance e a tua postura só pode encher os arouquenses de orgulho. Claro que os concursos são o que são... Só um levará o prémio embora eu tenha visto e ouvido lá vários vencedores. Naquele palco passaram muitos meninos e meninas com talento bem acima da média. Mas nós gostamos dos que são nossos. E tu, agora és nosso. É por isso que embora não considere que sejas o candidato mais forte gostava muito que ganhasses. Por tudo o que escrevi acima.
Se num jogo de futebol tivesse de escolher entre o teu pai e o verdadeiro Chalana para jogar pela minha equipa a escolha era óbvia: seria o teu pai. Porque é isso que fazemos com os amigos, com aqueles a quem queremos bem. Porque no fim do jogo o Chalana continuaria a ser o Chalana, mas o teu pai continuaria a ser meu amigo.
Para mim, hoje, diria que és o Carlos do Carmo assim mais ou menos como o teu pai é o Chalana.
E embora isso seja o menos importante, gostava muito que ganhasses. Quanto mais não fosse, para ver o teu pai a sorrir na televisão e poder lembrar os meus filhos que tive o prazer de ser seu amigo no longínquo tempo da minha escola primária.
Um abraço.

Miguel

1 comentários:

Su disse...

Incrível a maneira como escreves e fazes com que possamos sentir cada palavra...
O "chalana" também é um sortudo por ter um amigo como tu🙌
Beijinho Miguel, e obrigado ❣️
Quanto ao Simão, já é um vencedor 💪