Porque é que nunca partiste...


Desculpa Ivone. Desculpa por não ter estado em Oliveira de Azeméis junto de muitos dos teus amigos, em especial aqueles do 11.º B que tão bem conhecemos.
Quis dizer-te adeus e não consegui. Talvez porque não fizesse sentido. Nunca poderia ser um adeus e, muito menos, o "último"...
Recordo muito bem o dia em que te disse olá pela primeira vez. Estava na secretaria da nossa escola com a Sónia e a Teresa a dar os meus primeiros passos como estagiário e entraste tu com aquele teu jeito de fazer e dizer as coisas e que eu ainda não sabia que te pertencia. "Então são estes os desgraçados?" - dizias tu à Teresa com aquela tua voz grave e imponente. Não descansaste enquanto não nos fizeste ali mesmo um pequeno interrogatório e o que nos rimos quando reagiste ao facto da Sónia ser oriunda das terras do Salazar. Começavam aí os nossos bons momentos.
Sabes, o teu nome não é muito vulgar e por esse facto, embora nunca te tenha dito, fazias-me lembrar dois momentos preciosos da minha vida. O primeiro eram os finais de tarde de segunda a sexta-feira passados a ver o programa "A Roda da Sorte" apresentado pelo Herman José (quando ainda estava em forma) em que foram tantas as vezes que cantava "Ó Ivone, ó Ivone, ó Ivone, goodbye my love". Até agora a frase parece fazer ainda mais sentido. E quando te via lembrava-me sempre dessas tardes tão boas mesmo sem nunca as ter passado contigo.
O outro momento que me trazias mesmo sem saberes tem também a ver com o teu nome mas, sobretudo, pelo teu jeito de ser. Por momentos as tuas feições, os teus gestos e as tuas palavras como que se confundiam com a célebre Ivone Silva que aprendi a admirar desde muito pequenino. Palavra de honra que foram muitas as nossas conversas que julguei que iriam acabar com aquela frase característica que ainda hoje está na memória da maioria dos portugueses: "Com um simples vestido preto eu nunca me comprometo"! E tu conseguias trazer tudo isso para ali onde todos os professores se riam, muitas vezes apenas à tua passagem.
Para ti, eu e a Sónia éramos os "pintainhos". E nós gostávamos disso. Perguntavas constantemente se a Teresa nos estava a dar muito trabalho e ainda me lembro de ter um tarde livre porque estavas sempre a ver-nos na sala dos professores a trabalhar e não descansaste enquanto a Teresa não nos dispensou.
Até nas mensagens que trocávamos no facebook, onde me perguntavas também pela minha pequena Rita mesmo sem a teres conhecido, conseguias arrancar-me um sorriso pois mesmo aí não tinhas qualquer receio de utilizar as palavras menos próprias. Na verdade, assim tornavam-se muito mais cómicas. Obrigado também por isso.
Vejo, pelas reacções dos nossos amigos do 11.º B, o quanto significavas para eles e de como eras ainda maior do que eu julgava ser possível.
É, de facto, impossível não gostar de ti. Do teu riso de timbre grave que preenche um sala. Das papas na língua que não tinhas. Sobretudo, da tua presença. E tu vais continuar presente porque, estou certo, os teus amigos continuarão a fazer memória.
Bem sabes que agora as minhas passagens por Oliveira são pouco frequentes e que as minhas memórias vão começar a falhar. Mas quero que saibas que sempre que a RTP Memória me trouxer as fantásticas rábulas da Ivone Silva eu vou-me lembrar da outra, daquela que conheci em Oliveira de Azeméis e que tinha um igual talento para me fazer rir.
Como diria o grande João Monge através da boca do João Gil: "Ainda tens que me dizer porque é que nunca partiste".

Miguel

P.S. - Ironia do destino. Faz hoje precisamente 5 anos que ofereci aos pintainhos do 11.º B um célebre livro intitulado "3x4=D". E eu não esqueço que estiveste a lê-lo nesse dia em plena sala dos professores...

1 comentários:

André Mota disse...

Muito bem escrito...

Quem diria que agora que o pessoal se estaria para juntar todo uma coisa destas fosse acontecer...

Só tive pena de não estar presente na terça-feira. Não pude mesmo.

Será difícil encontrar alguma professora com uma boa disposição como a prof. Ivone.

Resta-nos as recordações :)